Consumo de chás cresce especialmente entre países emergentes, como o Brasil. Mas as vendas dos chás britânicos perdem espaço no comércio internacional e entre os próprios britânicos, que espalharam pelo mundo a tradição do five o’clock tea
Com a maior profissionalização no mercado de chás para exportação em países asiáticos, o Reino Unido tem perdido espaço para o seu produto considerado praticamente uma grife internacional. Vendeu para o mundo, no ano passado, menos do que em qualquer outro ano desde 1993, último dado disponibilizado pela ONU (Organização das Nações Unidas). Foram negociados US$ 153,5 milhões, o que ainda o posiciona como o sexto maior exportador. Mas o montante representa queda de 17% na comparação com 2013.
Não é um movimento notado apenas na receita financeira, já que as estatísticas mostram que 2014 foi o segundo pior resultado, depois de 2012, também no volume exportado. A redução foi de 3,5% em comparação com o ano anterior. Enquanto isso, o Sri Lanka, maior vendedor mundial, teve alta de 5,3% no valor das exportações de chá, apesar de registrar queda de 8% na quantidade exportada. A China, o segundo maior exportador, aumentou sua receita com o produto em 2% enquanto o volume caiu 7,3%. A receita maior com menor volume exportado por parte desses países revela o comércio de produtos mais sofisticados ocupando mercados antes cativos do Reino Unido.
“As marcas britânicas estão sob forte competição de vendedores de países como Sri Lanka e China. Eles têm oferecido diferentes variedades e em embalagens atrativas aos consumidores”, explica Lionel de Roland-Phillips, da trader I&M Smith, baseada na África do Sul.
Mais máquinas, menos tradição
Essa não é a única má notícia para as marcas britânicas. Ao mesmo tempo em que estão perdendo mercado no exterior, chás como PG Tips, Tetley e Twinings lutam contra a redução, lenta mas contínua, do consumo dentro do próprio Reino Unido. De acordo com dados da consultoria Euromonitor Internacional, o país ainda é o quinto maior consumidor de chá no mundo, mas, enquanto em 2009 cada pessoa consumia, em média, 1,6 kg de chá, a quantidade caiu para 1,4 kg, em 2014. O paladar dos britânicos tem-se voltado para o café, cujo consumo per capita subiu, no mesmo período, de 900 gramas para 1,2 kg.
Howard Telford, analista sênior para bebidas da Euromonitor Internacional, observa que “apesar de permanecer alto, o consumo do chá preto, o mais comum no Reino Unido, já é um produto de massa entre os britânicos”, e, que, portanto não há muito espaço para crescimento. “Ao mesmo tempo, estamos vendo um forte crescimento na venda de cápsulas de café e de grãos premium de café”, comentou.
Para Roland-Phillips, “uma mudança dentro das empresas” também ajuda a explicar a queda no consumo de chá. “Três a quatro xícaras de chá eram oferecidas a cada funcionário na maior parte das indústrias e escritórios no Reino Unido. Mas a instalação de máquinas de bebidas em locais de trabalho, aumentaram o interesse por refrigerante e café, como alternativas ao chá”, disse ele. Com isso, também as importações de chá no Reino Unido caíram cerca de 20% ao longo da última década.
De qualquer forma, se os britânicos hoje consomem 70 milhões de xícaras de chá por dia, bebem, na verdade, quase o dobro: 165 milhões de xícaras, porque 98% acrescentam leite à bebida, revela pesquisa da UK Tea & Infusions Association. O leite é aceitável, mas misturar açúcar não é considerado de bom tom, já que mascara o sabor original.
O único setor em crescimento no mercado britânico hoje é o de chás mais sofisticados e de maior valor agregado, “especialmente chás frutados ou herbais”, segundo Telford. O consumo de chá verde tem crescido, “convertendo consumidores do tradicional chá preto para novos sabores e misturas”, diz o analista da Euromonitor. “O chá verde é o que tem crescido mais rapidamente tanto no Reino Unido quanto nos Estados Unidos e deve se manter nesse ritmo nos próximos cinco anos”, acredita.O chá verde se popularizou no Ocidente, nos últimos anos, depois que foram difundidas informações sobre propriedades de prevenção de várias doenças e de auxílio em dietas de emagrecimento.
Mais brasileiros consumindo
O mercado internacional de chá, segundo a Euromonitor, cresceu 2% em volume no ano passado, mesma performance de 2013. Igual alta é esperada para este ano, puxada pelos países emergentes, como o Brasil, que aumentou suas compras em 7% em 2014 na comparação com 2013, se destacando os chás de frutas, herbais e chá verde.
“Apesar de os brasileiros ainda não serem ‘bebedores estalecidos’, há percepção de que o chá é uma opção mais leve e saudável, particularmente quando servido frio”, avaliou Telford. “Também aumentou no país a quantidade de lojas que oferecem chás de alta qualidade”.
A tradição do chá das cinco
Entre os europeus, os portugueses foram os primeiros a consumir chá, depois de conhecerem o produto no Japão em 1543, em viagem de trocas comerciais. No Japão, o hábito teria sido introduzido por monges budistas a partir de sementes chinesas.
O uso na Inglaterra é atribuído a Catarina de Bragança, princesa portuguesa que casou com Carlos II da Inglaterra. O chá era bebido em cafés e seu consumo foi crescendo desde o final do século XVII. No início do século XIX, a tradição do chá da tarde (“five o’clock tea”) foi instituída pela sétima duquesa de Bedford, em Londres, Anna Maria Russell, A duquesa fazia um pequeno lanche entre o almoço e o jantar, acompanhado de uma xícara de chá com leite.
O hábito foi seguido por aristocratas e burgueses ingleses em suas casas, que aproveitavam a ocasião para exibir porcelanas e pratarias. A tradição se espalhou pela Europa e salões de chá passaram a servir o chá das cinco ou five o’clock tea.
A bebida, dizem, faz parte até da guerra da independência dos Estados Unidos. Em protesto contra a cobrança de impostos, americanos derrubaram uma carga de chá transportada por navios da Companhia Britânica das Índias Orientais no Porto de Boston. O motim foi apoiado por 13 colônias, dando início à guerra.
Na índia, que esteve sob domínio inglês de 1858 até 1947, e de onde o chá também é originário, o uso é mais frequente na região norte, onde é servido no café da manhã e à noite. Chamado popularmente de chaai, é consumido quente com leite e açúcar, quase todo do tipo preto.
Chás preto e verde
O chá preto é feito de folhas da planta Camellia sinensis, árvore nativa da China e da Índia. Suas folhas passam por um processo de fermentação, depois são aquecidas e desidratadas. O resultado é o tom avermelhado escuro e o sabor intenso. O chá verde é feito da mesma planta com a diferença que as folhas não são fermentadas. Após a colheita, elas recebem uma vaporização e depois vão para a secagem. O sabor é levemente amargo.
Fonte: Maeli Prado/Fato Online